Para que serve a literatura (parte 2)
Eu pensava que os livros nos davam um presente, uma dádiva misteriosa; hoje, contudo, também sinto o oposto: a literatura arranca algo de nós
Viva!
Vamos continuar a conversa sobre para que serve a literatura?
Se você chegou aqui antes de ler a parte 1, sugiro que volte e comece por lá, onde eu discuti se a arte (e a gente) precisa servir para alguma coisa antes de falar sobre as funções estética (ser bela e aprazível aos sentidos) e social (criticar ou denunciar a realidade, imaginar mundos possíveis) do texto literário.
Agora, quero explorar como a literatura também estimula razão e sensibilidade.
A literatura faz com que a gente sinta. Simples assim, mas em toda a sua complexidade. Durante uma (boa) leitura, sentimos raiva, compaixão, alegria, tristeza, saudade, inveja, entre outras coisas mais.
Até a chamada subliteratura, a literatura de folhetim, as novelas produzidas em escala industrial, podem despertar emoções poderosas. A literatura erótica excita (o corpo e a imaginação). A literatura de horror assusta.
Quem consegue atravessar os melhores textos de Edgar Allan Poe (1809-1849) sem sentir arrepios na espinha? Ainda adolescente, senti verdadeiro horror ao perceber que as 32 pecinhas de marfim branco que caíam ao chão eram os dentes de uma mulher, em Berenice. Perdi o sono com o palhaço assassino de Stephen King, Pennywise, e com o misterioso cigano que amaldiçoara um homem a emagrecer até a morte.

A literatura tem essa potência.
Eu costumava pensar que a literatura nos oferece qualquer coisa; cada livro seria uma espécie de presente muito frágil e precioso.
Ultimamente, contudo, tenho sentido o exato oposto. Parece que a literatura também tira qualquer coisa de mim. Ela corta, rasga, arranca.
Que coisa será essa?
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